“Geralmente superestimamos os retornos e depois subvalorizamos o uso”
Frase atribuída genericamente a gestores de projetos, especialmente de TI, por várias décadas
Nos últimos meses temos visto a “quebra da onda” sobre Inteligência Artificial. Após a euforia ocasionada pela percepção e primeiros usos do relançamento do chatbot ChatGPT pela OpenAI, com todos dialogando livremente via smartphones sobre assuntos aleatórios, eis que a imprensa de negócios exibe casos de investimentos sem retorno, decepções e outras menções negativas sobre a adoção da Inteligência Artificial em organizações.
Não é surpresa de forma alguma. A citação que abre o texto, dos dois momentos de aparição de uma tecnologia ou serviço potencializado por tecnologia – antes e depois do lançamento e constatação – já é algo clássico para profissionais de setores de mercado com altas taxas de mudança, como TI, Saúde, Comunicação, Finanças, Eletrônica, entre outros: o surgimento e proposição de um novo serviço é cercado de euforia. Posteriormente, quando estas inovações (sim, inovações) tornam-se uso cotidiano, há o esquecimento, não se percebe mais esta incorporação.
Algum tempo atrás (temos um autor com certa idade… 🙂 ) vivemos a oferta dos primeiros sistemas de informação integradores, como os ERPs, SCMs e mesmo os de uso mais orientado à integração estratégica, como os CRMs. Outros eventos se sucederam, apenas neste lapso de tempo: A computação distribuída, sob o slogan “um computador na mesa de cada colaborador”. O uso de Internet comercial e os sites de comércio eletrônico (lembram-se do “vendeu e não conseguiu entregar”?). A multiplicidade de aplicativos, plataformas e as configurações de Omnichannel sem sintonia, que acabavam por apresentar algo como competição de uma empresa contra ela mesma, sob a ótica de clientes. E… como está o uso do Metaverso? Todo mundo se reunindo virtualmente na sua empresa 24×7?
Reduzindo a onda atual de IA a uma concepção de aplicação tecnológica (não é só isso, definitivamente), podemos perceber a mesma energia de marés, o mesmo ir e vir do mercado. A hype avançou inicialmente com as projeções de substituições de empregos, de processos e impactos em desenhos organizacionais. Promessas, aplicações idealizadas e casos de uso onde só havia a parte do sucesso, como de hábito, se sucederam. Aí, como era de se esperar, “alguns meses depois”, nada de resultados e as constatações negativas: “Tudo não passou de uma onda”.
A atual aplicação da inteligência artificial é algo que veio para ficar, algo que integra décadas de proposições teóricas em projetos de pesquisa em instituições universitárias de todo o mundo que, no geral, foram bem-sucedidas em suas postulações teóricas, sem condições de implementação por insuficiência tecnológica. As curvas de crescimento do conhecimento teórico e da disponibilidade tecnológica se cruzaram há poucos anos, permitindo que a IA se torne uma realidade em nossos dias. E este é um caminho sem volta. A inovação é, finalmente, incorporada em nossas vidas, se torna algo que usamos na cozinha, na sala, no banheiro, em nosso transporte e… é adotada finalmente. Quer maior sucesso que isso?
Os projetos de IA demandam a definição clara de objetivos a serem atingidos (ou então assumir-se que se tratam de especulações, o que não é errado, definitivamente, mas deve ser tratado como tal), ter seus escopos, cronogramas e orçamentos previstos e uma gestão de riscos bem determinada. Ir pela hype tem seus custos, euforia é motivação, mas dificilmente se constrói algo apenas com “woo-hoos”.

George Leal Jamil é professor, pesquisador e consultor independente, atuando na área de produção de conhecimento de base para gestão estratégica de negócios. É conselheiro da REDE LÍDERES DIGITAIS e da Assespro
Sempre temos defendido, com nossos interlocutores, a cautela, informação e conhecimento sobre o desenho de projetos de IA. Não se trata de nenhuma reinvenção, é aplicar a Gestão de Projetos, com suas devidas adaptações (admitindo-se, por exemplo, a agilidade), para traçar um percurso gerenciável com objetivo de ter retornos esperados de aplicação da IA para negócios. É muito importante ter-se em mente que os serviços e produtos gerados com IA e a partir de IA demandam tempo para construção, obtenção e ajuste de modelos (do cliente ou de terceiros), desenho de uma arquitetura de informações mínima que permita perceber onde estão os dados e informações e para onde irá o conhecimento gerado e, finalmente, um espaço amplo para o aprendizado.
Este último passo encerra a grande expectativa de um projeto de IA: aprendizado. Com a maturidade de desenvolvimento e implementação (Ágil? Pode ser!) de um projeto de inteligência artificial temos a oportunidade de gerar conhecimentos no contexto que já atuamos – como a apreensão da jornada do consumidor em maior escala e detalhamento – bem como permitir melhor uso do conhecimento já produzido. Adicionalmente, podemos ter o efetivo aprendizado com a adoção progressiva das soluções e camadas de inteligência artificial, descobrindo aspectos e relacionamentos entre os nossos dados, que escapavam ao uso rotineiro dos recursos.
Em nossos próximos artigos desenvolveremos um pouco mais estes cenários para a adoção dos projetos de IA. A IA é definitiva, requer tempo e preparo e seus retornos são permanentes, em implementação e perspectivas.